Como funcionam as margens no negócio do Vinho?
Uma das perguntas que mais me fazem os meus alunos e alguns seguidores é: Como funcionam as margens no negócio do Vinho?
É uma excelente pergunta, muito pertinente e importante. E com mais de uma resposta.
Muitos fatores entram para esta questão, desde logo o Mercado onde atua e o posicionamento dos Vinhos.
Vou tentar responder e ajudar, quem pensa começar, quem está a começar, ou quem já começou e tem um excelente Vinho, mas que não se vende… Entre muitos motivos, um pode ser as margens que definiu ou não definiu para a cadeia de distribuição.
Antes de concretizar, é importante definir alguns conceitos.
De forma muito sucinta, importa distinguir margem bruta, de margem líquida.
A margem bruta, que é o valor que vamos utilizar hoje, é a margem que cada produto liberta quando é vendido, independente de custos.
Se compro um produto a 10 e vendo a 15. A margem bruta é 5.
Margem Bruta=(5/15)*100
Margem Bruta= 33,33%
Já a margem líquida, contabiliza também a despesa da empresa, pode ser dividida por produto ou calculada no global, que é o mais habitual.
Posto isto já percebeu, que apesar de falarmos sempre de margens brutas, é muito importante perceber que cada negócio tem a sua estrutura de custos e pode obrigar a trabalhar com margens diferentes.
Outro conceito, muito importante para falar de margens, apesar de parecer que não está diretamente ligado, é o Sell Out. A venda ao consumidor final, em cada ponto de venda. E o que vamos fazer para aumentar este número, seja se formos nós a vender diretamente ou um parceiro.
Vamos então olhar para a cadeia de distribuição no Vinho, de forma simples, sendo que hoje pode haver muitas cadeias diferentes, o que significa margens diferentes e modelos de negócio diferentes.
Na verdade, o nosso modelo de negócio e os canais de distribuição que decidimos utilizar vão ditar as margens que devemos colocar.
E claro por fim que decide se colocámos as margens certas, é o consumidor, se está a comprar ao preço certo e a cadeia de distribuição está satisfeita em fazer chegar o produto ao consumidor.
Qual a margem do Produtor? Esta é provavelmente a pergunta mais difícil de responder, porque já todos vimos Vinhos engarrafados à venda por 2 Euros e por 100 Euros, será que o de 100 Euros custou 50 vezes mais a produzir? Provavelmente não, mas eventualmente pode ter custado mais de 50 vezes mais a criar a marca para que o consumidor pague 100 Euros.
Então antes de irmos à margem, o que é o que o Produtor tem de ter em conta antes de decidir a margem, os custos dos materiais diretos, desde a uva, aos tratamentos, garrafas, rolhas, rótulos, caixas, etc. Os custos da mão de obra, desde a adega, administrativo, comercial, marketing, etc com os respectivos impostos e ainda os custos fixos.
Depois disto ainda podem ser somados os custos de entrega, marketing, etc.
Ou seja, temos um custo muito mais elevado do que apenas o vinho e os secos, é óbvio que as empresas que conseguem crescer e atingir volumes elevados de produção e facturação, conseguem diluir mais os custos de mão de obra e custos fixos, fazendo que o custo dos seus Vinhos seja menor.
Depois, além do custo, é necessário olhar para o mercado e para o investimento que temos disponível, qual o público que queremos atingir? Que vinhos consome este público?
Que preços têm estes Vinhos e onde estão à venda?
Todos estes fatores contribuem para a decisão do preço e respectiva margem a aplicar pelo Produtor. E temos desde margens que ficam certamente em 1 dígito, por necessidade ou estratégia para determinada categoria, e temos margens acima de 100% nas categorias mais altas.
Diria que em média e falando de margem bruta, os produtores médios, com vinhos de categorias intermédias, podem pensar em margens entre os 40/50%, em que baixam nas categorias mais baixas e sobem nas mais altas.
Ups… Estou a cometer o erro que alguns Produtores, cometem, estou a falar em margens, sem falar em canais. Então estes 40/50% devem ser para que canal?
Depende de quantos elementos queremos ter na Cadeia de Distribuição e que canais vamos utilizar?
Eu diria que se apenas vamos vender diretamente ao consumidor, seja online, seja em lojas próprias, enoturismo, podemos pensar numa margem mais elevada. Se vamos vender a Importadores e Distribuidores podemos pensar nestes 40/50%, dependendo obviamente do posicionamento e muitos outros custos e fatores.
Então para simplificar, voltamos à cadeia tradicional, o Produtor tem um custo de 2 Euros para fazer o Vinho, coloca 50% de margem, venderá o Vinho a 3 Euros aos Distribuidor, o Distribuidor terá uma margem entre 25% a 40% (de cima), se vender a 5 Euros, terá uma margem de 2 Euros por garrafa, que equivale a 40%.
Se o Distribuidor vender a uma Garrafeira, esta deseja ter uma margem de 25%-30% , então venderá o Vinho à volta dos 7 Euros.
A pergunta é, será que todos os Distribuidores são iguais, todas as Garrafeiras são iguais? Será que o consumidor na sua decisão só olha para o preço?
Ou um Distribuidor com uma equipa comercial bem treinada, com uma boa logística, com um bom portfólio, consegue ter uma margem melhor nos seus produtos, porque os Produtores têm interesse em trabalhar com ele?
E será que uma Garrafeira bem localizada, com Sommelier, com entregas rápidas, consegue vender os seus Vinhos um pouco mais caros, ou comprar um pouco mais baratos, porque tanto consumidor como distribuidor percebem o seu valor?
São questões difíceis de responder, e só o mercado e a execução dos pressupostos de valor responderão. Se se conseguir passar para a cadeia o valor, então sim o normal é que a resposta seja positiva.
Já temos margens para o Distribuidor e para a Garrafeira, excelente! E na loja online e no enoturismo do Produtor?
“É simples, se é direto, é mais barato! Não há intermediários, vamos colocar um preço melhor que os nossos parceiros e ganhar mais dinheiro.”
Talvez este seja o maior erro dos pequenos/médios produtores, sabotarem a sua própria cadeia de distribuição. Se colocam um preço mais barato ao vender diretamente, estão a prejudicar os vossos parceiros.
Além de não ser correto, não é muito lógico. Se prejudicamos os nossos parceiros, eles vão interessar-se cada vez menos pelos nossos produtos.
Ou temos uma lógica 100% DTC ( Direct to Consumer - Directo ao Consumidor) através de canais próprios, ou então a nossa preocupação número 1, deve ser proteger e ajudar a nossa cadeia de distribuição. Distribuidores, Garrafeiras, Lojas, Restaurantes, etc.
Faz sentido? Quando construir o preço, parta do preço que gostaria que o seu Vinho chegasse ao consumidor e venha por aí abaixo, atribuindo a margem a cada elemento da cadeia. Mesmo que em alguns casos, como loja online, marketplaces, enoturismos, etc possa não ter tantos parceiros na cadeia, respeite os que existem.
E outra questão. Quando começar a sua estratégia, pense que se quer crescer, dificilmente será sem parceiros, por isso tenha cuidado com os preços que pratica no início, porque depois é extremamente difícil acomodar vários parceiros e dar-lhes margem.
Vejo inúmeros Produtores com esta dificuldade, começaram a vender direto ao consumidor, a alguns restaurantes e não acautelam que precisam de parceiros e que esses parceiros precisam de ser sustentáveis, pagar as contas e preferencialmente ganhar dinheiro.
E os Restaurantes com essas margens loucas? Não discordo que haja restaurantes com margens exageradas, mas é preciso ver que o custo de vender vinho num restaurante é totalmente diferente de vender uma garrafa fechada. As despesas de um restaurante, o serviço, os copos, etc, etc.. tal como no custo do Produtor, vão ter de ser colocados no Vinho e nos restantes itens vendidos.
É um tema bastante debatido e controverso, e cada empresa sabe dos seus custos, margens,etc.
Deixo apenas duas questões para os proprietários, sommeliers, e responsáveis de f&b, que já fazem na maior parte dos casos um excelente trabalho.
Se marcarem os Vinhos um bocadinho abaixo, o cliente irá a uma outra garrafa e aumentará a margem da mesa, mesmo que a margem em cada garrafa tenha diminuído?
Será que faz sentido o markup ser igual em todas as categorias de Vinho? Será que não é mais importante olhar para a margem absoluta por garrafa?
Sei que há muitos consumidores insatisfeitos com os preços dos Vinhos nos Restaurantes, e também Distribuidores e Produtores, que sabem a quanto vendem e a quanto o Vinho é vendido no Restaurante. Não tenho uma varinha mágica para resolver esta questão, mas penso que diálogo, formação, empatia e acções conjuntas podem ajudar os vários parceiros a vender mais.
O preço pode parecer que é algo feito em excel e totalmente racional, mas não é, é importante perceber o que se pretende para a nossa marca e como se pretende que ela seja representada. Se não dermos condições aos parceiros para estarem confortáveis a representar a nossa marca, teremos sempre um jogo de cadeiras e uma gritaria entre garrafeiras, lojas online, produtores, etc….
Conclusão:
Ao definir os preços e margens é importante ter em conta:
Custos do Produto + Secos + Operação
Mercado
Posicionamento
Modelo de Negócio
Quantidades
Cadeia de Distribuição
Investimento
Só conjugando estes e outros fatores, podemos chegar a um preço justo e sustentável, para o nosso produto e para a cadeia de distribuição.
Espero conseguir ajudar um bocadinho, não existe um caminho apenas, mas é importante a reflexão e análise do mercado.