Chardonnay em cubas e barrica- Análise por Ana Coixão

Para melhor compreendermos a importância do recipiente onde ocorre a fermentação malolática dum vinho, nas suas características, foi analisado o técnico-científico “Use of oak wood during malolactic fermentation and ageing: Impact on chardonnay wine character”, escrito por M.R. González-Centeno, K. Chira, P.L. Teissedre.

A casta utilizada neste estudo (Chardonnay), foi escolhida pela sua versatilidade e flexibilidade de adaptação tanto a distintos terroirs como a produzir vários estilos de vinho, assim como pela sua capacidade de envelhecimento.

A exclusividade obtida através da fermentação malolática (FML) bem como o envelhecimento em barricas de carvalho, são cada vez mais interessantes de adotar em qualquer tipo de vinho, sendo processos feitos durante a vinificação, responsáveis por moldar o aroma e o sabor geral de qualquer vinho, apesar de serem mais associadas a vinhos tintos.

Tendo isto em conta, o objetivo desta pesquisa foi investigar de uma forma mais aprofundada o efeito do recipiente da FML e três níveis de tosta (T1, T2, T3) sobre a composição fenólica (incluindo taninos elágicos – também chamados de elagitaninos), o perfil aromático e os atributos sensoriais de dois conjuntos de vinhos brancos da casta Chardonnay: um em que a FML e o envelhecimento foram realizados em barricas de carvalho, e outro onde a FML foi realizada em cubas de aço inoxidável antes do envelhecimento em barricas.

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De seguida, os autores dividiram os materiais e métodos em 8 pontos, começando pela origem da madeira de carvalho e condições de secagem. Foram cedidas 5 barricas para cada tipo de tosta.

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Foi explicado o processo de vinificação e recolha de amostras de Chardonnay, tendo uma parte dos vinhos passado o processo fermentativo e de envelhecimento em barricas e outra parte dos vinhos que passaram pela FML em cubas foi posteriormente transferida para envelhecer em barricas de carvalho, tal como já foi referido, com os diferentes níveis de tosta, durante 12 meses a uma temperatura controlada de 14-16°C e depois deste período os vinhos foram engarrafados e enviados diretamente para o laboratório a 16°C para posterior análise a diversos fatores, incluindo análise sensorial e estatística.

Os resultados foram então discutidos e apresentados da seguinte forma.

Independentemente do recipiente em que ocorreu a FML e do nível de tosta da barrica em que se encontravam, todos os vinhos apresentaram o mesmo pH, teor alcoólico, acidez titulável, acidez volátil e ácido tartárico.

O teor fenólico total em barricas T2 apresentou diferenças significativas (p<0,05) sendo superior nos vinhos que estiveram sempre em barrica, tal como seria esperado.

O teor total de elagitaninos nos vinhos Chardonnay após 12 meses de envelhecimento em barricas de carvalho, foi superior na barrica T2 entre 1,4 e 2,7 vezes mais do que T2 de vinho proveniente de cuba, o que pode ter sido influenciado por esta ter o menor nível de tosta. A castalagina foi o principal elagitanino com uma contribuição entre 40 e 49% para o conteúdo total, enquanto que os restantes representaram menos de 2,5% em todos os casos estudados. No caso das tostas T1 e T3, os vinhos com FML em cuba apresentaram valores semelhantes de elagitaninos individuais e totais em comparação com os vinhos de FML em barrica.

O teor total de compostos voláteis amadeirados, variou de 3303 a 4207 μg/L para os vinhos com FML em barrica e 6603 a 9326 μg/L para vinhos com FML em cuba. Para as duas modalidades de FML, a tosta em T1 levou aos valores mais altos e a T3 aos mais baixos. Ao contrário do que era esperado, em todos os níveis de tosta, o teor total de compostos voláteis amadeirados foi de 2,0 a 2,2 vezes maior em vinhos com FML em cuba do que nos vinhos com contato com madeira de carvalho durante a FML (p<0,05), especificamente, teores de furfural e 5-metilfurfural foram 2,3 a 2,8 vezes significativamente maiores (p<0,05), tendo se verificado apenas os vinhos das barricas T1 significativamente diferentes (p<0,05) dos T2 e T3. A vanilina foi o principal composto volátil. De um modo geral, o aroma amadeirado foi mais influenciado pela FML do que pela tosta, o que pode ser atribuído às temperaturas próximas entre cada tipo de tosta utilizadas neste projeto experimental.

Os resultados obtidos relativamente ao aroma frutado sugerem que as condições particulares dadas por cada recipiente FML (ou seja, processo de micro-oxigenação e libertação de compostos lenhosos no vinho quando a FML ocorreu em barricas, mas não em cubas) podem melhorar a síntese (em cubas) ou a hidrólise (em barricas) de ésteres durante esta etapa de vinificação. Foram percecionadas notas de pêra, maçã, abacaxi e florais. No que se refere aos ácidos ramificados dos ésteres etílicos, verificaram-se concentrações 9,6 a 10,4 vezes mais altas que os limiares de perceção correspondentes, conferindo ao vinho notas de limão e abacaxi. O acetato de isoamilo, caracterizado pelo aroma a banana, foi o principal componente entre os acetatos alcoólicos mais altos, com valores variando de 707 a 861 μg/L de vinho. O aroma frutado, tal como o amadeirado, foi mais impactado pela FML do que pela tosta.

O teste triangular e de comparação pareada foram realizados para os vinhos fermentados em barrica e em cuba para cada nível de tosta separadamente.

Dentro de cada modalidade de FML, os resultados preliminares dos testes de preferência mostraram que os vinhos das barricas T2 eram geralmente os mais apreciados (42-63%), enquanto os vinhos das barricas T1 eram os menos (42-56%).

No caso da tosta T1, os provadores relataram diferenças significativas (p<0,05) entre as modalidades de FML em relação aos descritores olfativos a frutas cítricas e flores brancas, indicando maior intensidade para os vinhos de FML em cuba, o que pode ser atribuído à concentração um pouco mais alta de ésteres do vinho fermentado em cuba. No caso das tostas T2 e T3, as duas modalidades FML não foram diferenciadas em relação aos descritores olfativos (p>0,05), mesmo tendo, os vinhos fermentados em cubas, exibido maior teor de ésteres.

Em jeito de conclusão, os autores verificaram que a disponibilidade e capacidade de extração dos compostos de madeira de carvalho dependem diretamente da tosta, observando um perfil de elagitaninos específicos para cada vinho considerado. Por outro lado, a FML geralmente exerce maior influência sobre a composição aromática dos vinhos Chardonnay. Os vinhos fermentados em barrica apresentaram maiores quantidades de whiskey-lactonas e vanilina, mas concentrações ligeiramente menores de certos compostos voláteis frutados.

Dependendo do estilo pretendido, sugere-se aos produtores, que podem obter vinhos com maior intensidade aromática a frutos secos quando a FML ocorre em barrica, ou maior intensidade aromática cítrica e floral quando os vinhos passam pela FML em cubas.

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De qualquer forma, os resultados sugeriram que o uso de barricas com diferentes níveis de tosta não altera a perceção dos principais aromas (pêssego, damasco e sílex) que definem o caráter do Chardonnay, assim como não afeta a sua intensidade aromática e os atributos de persistência, doçura, acidez, volume de boca e/ou amargura, nem confere um aroma amadeirado significativamente mais alto que possa mascarar o caráter frutado, floral e mineral dos vinhos desta casta.


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Por Ana Coixão






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